Primeiros resultados do estudo "Como dormimos em tempos de pandemia?"

Divulgação de 19 de março de 2021, por ocasião do Dia Mundial do Sono

SÍNTESE EM 4 PONTOS PRINCIPAIS TENDÊNCIAS ENCONTRADAS “COMO DORMIMOS EM TEMOS DE PANDEMIA” – junho e julho de 2020 (“desconfinamento” progressivo, após 1ª vaga em Portugal)

  1. Impacto diferenciado da situação pandémica no sono: há pessoas a experimentar piorias de sono (45,7%); pessoas que mantêm o seu padrão de sono (37,8%); pessoas que experimentam melhorias do sono (14,6%);

  2. Referiu ter piorado o seu sono cerca de metade das mulheres e dos estudantes, assim como a maioria dos cuidadores e das pessoas que se encontravam com os filhos de idade escolar em casa a necessitar do seu acompanhamento;

  3. Os horários médios de deitar e de acordar durante a semana foram mais tardios, aproximando-se dos horários de fim de semana. Logo, diminuíram as discrepâncias horárias - redução do jet lag social. Esta maior regularidade pode ser positiva e contribuir para um sono de melhor qualidade.

  4. Através da comparação com uma amostra de 2017, estima-se que os sintomas clinicamente significativos de insónia passaram de 11% (amostra de 2017) para 18% (amostra que respondeu ao inquérito durante a pandemia).

PANORAMA DOS PRIMEIROS RESULTADOS "COMO DORMIMOS EM TEMPOS DE PANDEMIA” - DIVULGAÇÃO POR OCASIÃO DO DIA MUNDIAL DO SONO 2021

O inquérito realizou-se em junho e julho de 2020 (período de “desconfinamento” da 1ª vaga em Portugal).

A amostra selecionada para a análise compreende 1079 pessoas sem trabalho noturno (para não afetar estimativas horárias). A grande maioria são mulheres (81%) e a amostra representa sobretudo pessoas com frequência ou a concluir o ensino superior (71%), com idades dos 12 aos 86 anos, média de 45,7 anos. A maioria encontra-se profissionalmente ativa (68,3%), 14% são estudantes e 15% reformados/desempegados/em situação prolongada de baixa/atestado. Estão em trabalho presencial cerca de 14,5% e em trabalho ou ensino à distância cerca de 55,9%.

Obteve-se uma representação relativamente equilibrada de todas as regiões de Portugal.

Instrumentos

Inquérito online compreendendo perguntas sobre dados sociodemográficos e de caracterização da situação ocupacional e contexto doméstico-familiar durante a situação pandémica; questões sobre horários de sono-vigília durante a pandemia e estimativa retrospetiva do que sucedia previamente; Escala Básica de Sintomas de Insónia e Qualidade de Sono – BaSIQS; ISI – Índice de Gravidade da Insónia, verão portuguesa do Insomnia Severity Index de Charles Morin.

Principais resultados e sua interpretação

Em média, os horários durante a semana passaram a ser mais tardios, aproximando-se do que sucede ao fim de semana. Assim, tornaram-se significativamente menores as oscilações horárias entre dias de semana e de fim de semana - em termos médios, houve redução do jet lag social. Provavelmente, há mais pessoas a conseguir seguir a tendência natural do seu ritmo de sono-vigília na situação pandémica. Estes são valores médios, pois podem ter existido pessoas que atrasaram exageradamente o seu ritmo de sono, excedendo os horários que gostariam de cumprir. Por seu turno, outras pessoas mantiveram os seus horários praticamente na mesma.

Quando se pergunta como mudou o seu sono:

  • 45,7% sente que o sono piorou;
  • 37,8% está na mesma;
  • 14,6% refere que o seu sono melhorou.

(a restante percentagem compreende situações em que não foi possível determinar o sentido da melhoria).

Quem melhorou é significativamente mais jovem em comparação com os outros grupos (39,3 anos). Neste grupo que “melhorou”, a grande maioria das pessoas está em teletrabalho ou ensino à distância.

Sobre quem piorou: declarou que piorou 50% das mulheres da amostra (e 30% dos homens); 63% dos que estão a cuidar de pessoas que requerem cuidados durante a noite (situações não relacionadas com o COVID, como cuidados com bebés pequenos e idosos); 53%* de quem está/esteve a tomar conta de familiares por causa da situação pandémica; 57%* de quem durante a pandemia tinha crianças em casa a necessitarem do seu acompanhamento; cerca de metade dos que se encontram em teletrabalho e dos estudantes.

(*pelo menos esta percentagem).

A percentagem de quem piorou pode não traduzir a percentagem real na população, pois este tipo de amostra não é necessariamente representativa: podem ter respondido mais pessoas que estavam com dificuldades de sono. Isto não significa desvalorizar a quantidade de pessoas afetadas, mas sim ter noção que as percentagens reais poderão ser diferentes.

A população ativa está representada de forma proporcionalmente equivalente em todos os grupos, mas o grupo cujo sono “melhorou” tem proporcionalmente a percentagem mais alta de casos a trabalhar/estudar à distância (72,8%), seguindo-se o grupo que “piorou” (58,5%) e o grupo “na mesma/sem problemas” (52,1%).

Numa segunda análise conseguimos comparar subamostras equivalentes de 2017 e 2020, cada uma destas com 410 participantes (amostras equivalentes no que se refere ao sexo, idade, nível de escolaridade, região, situação ocupacional):

Globalmente, esta análise entre amostras equivalentes mostra que as mudanças podem ter sido menos acentuadas do que sugerem os resultados quando se considera apenas a altura da pandemia.

Comparando as amostras confirmámos a tendência de horários já descrita – os horários tornaram-se mais tardios durante a semana, ao passo que ao fim de semana mantiveram-se. No entanto, quanto à qualidade de sono (BaSIQS), a média não se modificou significativamente. Quanto à medida na escala de insónia (ISI), mudou ligeiramente. Já observando as percentagens de pessoas com insónia clinicamente significativa, em 2017 era de 11% ao passo que o valor de 2020 é superior, 18,3%.

Este valor de 18% parece-nos a estimativa mais precisa da insónia em pessoas entre os 18 e 64 anos. Significa então que temos uma muito provável subida de casos clinicamente relevantes de insónia - mais 7% de pessoas.

Em conclusão, o impacto da pandemia no sono pode ter sido bastante diferenciado. Se muitas pessoas sofreram pioria, uma outra parte manteve o padrão de sono intacto e há ainda quem melhore. Cada um destes grupos tem as suas características próprias e o seu próprio contexto. Nem todos dormem pior: há quem consiga obter melhor sono, como menos diferenças semana-fim de semana, provavelmente porque consegue respeitar mais o seu ritmo em situação de teletrabalho e talvez podendo gerir os seus horários mais livremente e sem perder tempo em deslocações.

Quem mais piora também compreende pessoas em teletrabalho, mas que parecem estar em situação de sobrecarga (mais do que outros grupos), pois compõem este grupo a maior parte das pessoas que precisavam de acompanhar filhos em casa, bem como das pessoas que têm de cuidar/apoiar familiares.

Nota final: os dados da investigação conduzida continuam em análise e serão submetidos para publicação em revistas científicas, sendo oportunamente divulgados em próximas ocasiões.


NOTA: Um estudo promovido pela APS – Associação Portuguesa do Sono, em conjunto com o CINEICC – Centro de Investigação em Neuropsicologia e Intervenção Cognitivo-Comportamental (Universidade de Coimbra – Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação), com o apoio à divulgação da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP) - Via Verde de apoio OPP para a Investigação Científica em Saúde Psicológica e Mudança Comportamental.

Equipa envolvida
Ana Allen Gomes 1, 2, 4, Mariana Miller 1, 2,4, Carolina Araújo 1, Inês Clara 1, 2, Vanda Clemente 1, 2, 3, 4, Joaquim Moita & Direção da APS 3,4

1) UC – FPCE | 2) CINEICC | 3) Centro de Medicina do Sono (CMS) do CHUC | 4) APS

Subscreva a nossa newsletter!

© 2020 Associação Portuguesa de Sono

Contactos:
Rua João da Silva, n.º 4 C 1900-271 
Lisboa, Portugal 
Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.| (+351) 211 316 527

Membro associado da